Coisas Que Amo Muito: o ranking dos musicais sobre A Revolução
🚀 Olá, astronautas! 🚀
Esse ano eu caí num buraco inexplicável de musicais. Eu gosto de musicais desde a estreia de High School Musical na televisão brasileira, mas esse ano sei lá o que aconteceu e eu caí num buraco enorme. Talvez eu tenha cavado minha própria cova. Comecei um projeto proto-secreto por puro hobby que tem a ver com musicais, voltei a ouvir álbuns de musicais que não ouvia há milênios, chorei ouvindo Defying Gravity mais vezes do que acho ok, outro dia me peguei traduzindo Jesus Cristo Superstar só porque estava inspirada, e o mais fundo do buraco: comecei a ver Cultura, O Musical - o reality lixo estilo The Voice pobre pra musical através do olhar do colonizado mas sem essa consciência da TV Cultura.
Então é isso. Eu tô no buraco. Tanta coisa se passando no mundo, com as pessoas, comigo mesma, mas quem liga? Eu tô no buraco e quando se está em qualquer buraco de obsessões absurdas (percebeu a aliteração? É por causa do buraco) só existe uma forma de sobreviver: abraçando o momento. Carpe bvracvm, como diriam os latinos.
Por isso mesmo que decidi fazer algo que há muito queria fazer, mas ainda não tinha feito porque às vezes a gente é meio boba e a vida é assim mesmo. É assim que hoje, na série abandonada Coisas Que Amo Muito, apresento a vocês o:
✨ RANKING DOS MUSICAIS SOBRE A REVOLUÇÃO ✨
Santa Ceia, ano desconhecido
***
Agora, antes do ranking algumas perguntas que vocês poderiam ter e respostas que lhes dou:
1. Por que você tá fazendo isso na newsletter, Clara?
Olha, primeiro porque a newsletter é minha e eu faço o que eu quiser. Mas também porque eu tava com saudades de escrever bobagem. O mundo tá muito difícil, tá todo mundo precisando se divertir. Depois, como diz minha mãe, alegria é resistência. (Sim, ela foi jovem nos anos 80 e eu também consigo escutar aquele Você Não Soube Amar - Blitz tocando ao fundo dessa fala, mas eu concordo com ela. Já elaborei de formas mais bonitas isso nesta newsletter em dias mais introspectivos.)
Além disso, tem a questão de que ainda não tô querendo escrever as Coisas Que Escrevo aqui no momento. Tô naquele momento de vivência, no Processo. Não tá na hora de contar pra vocês. Então, pra não deixar aqui às moscas e porque minhas novas amigas pediram (olá, amigas, bem-vindas!), por que não falar de musicais e revolução, né não. Ah, e também porque esse seria um texto muito nichado pra publicar em qualquer saite. Então é isso aí. VAMOS SER ENTUSIASTAS DE ASSUNTOS NADA A VER!!!!
2. Você não é anarquista? Por que fazer um ranking?
Porque eu sou virginiana e minha diversão consiste em organizar coisas que eu amo a partir de métodos que eu mesma invento.
3. Por que musicais sobre a revolução, particularmente?
Porque esse é o meu nicho de musicais. Não sou theater kid, sou rebelde sem causa kid. Também não sou mais kid, mas vocês entenderam.
4. Sobre qual revolução você tá se referindo?
Sobre A Revolução™ (perceba aqui o uso irônico de ™).
4. E se eu não conhecer nenhum musical?
Não tem problema, porque eu explico direitinho e de maneira fidedigna a história de cada um deles.
***
Agora vamos falar de coisa séria. Vamos falar de METODOLOGIA.
A escolha dos musicais a serem rankeados se deu a partir de uma única questão: há uma revolução, ou pelo menos um ideal revolucionário, no roteiro do musical? Se a resposta é sim, então o musical entrou na lista.
Percebam: não é uma questão apenas de uma forma ou um ritmo revolucionários, a revolução precisa estar contida na história do musical de alguma maneira. É por isso que alguns musicais queridos por todos nós (ou, pelo menos, por mim) não entraram na lista. Por mais que eles sejam aparentemente revolucionários por terem personagens rebeldes ou subversivos (Grease e West Side Story) ou uma estética vanguardista (Tommy), não há o ideal revolucionário em nenhum deles. Inclusive, fun!fact: Grease é exatamente o contrário da revolução::::: os dois personagens principais se curvam às normas da sociedade e se convertem para algo que eles não são - uma badgirl e um goodboy.
Na lista também não está considerado Spring Awakening, que ouvir dizer que entraria na contagem a partir do crivo inicial, porque eu nunca vi/ ouvi o musical. Fui avisada de que ele poderia pegar em pontos sensíveis da minha história e, por mais que me interesse pela peça, não tô no pique de ser induzida a uma bad vibe no momento, obrigada. Também vi a apresentação de um menino cantando uma música de Spring Awakening no Cultura, O Musical e odiei profundamente. Então, como essa lista é minha e eu sou senhora de mim mesma e dessa newsletter, Spring Awakening foi cortado.
Agora para julgar os musicais que entraram na lista, duas perguntas foram a base pras notas: a revolução é o tema central?, e a revolução é bem sucedida? Depois, pra me divertir, decidi buscar o hino da revolução no musical e quais são os versos mais revolucionários de cada um deles. Curiosamente, não necessariamente os versos mais revolucionários são do hino da revolução. Pra cês verem que as nossas lutas são muito complexas.
Essas são a base para a nota final, que vai de 0 a 10. Como esse ranking é meu e de mais ninguém, é considerado também o meu gosto pessoal, que é único e indiscutível. É isto. Vãbora pro que importa!
escritores de internet que não são pagos:
we get the job done
11. aka: nem tinha que estar aqui, querida
Les Misarablès
A história: Existem pessoas pobres na França e é difícil
A revolução é o tema central? Reza a lenda que sim, mas não posso dizer nada ao certo porque é impossível ver cinco minutos desse musical da mesma maneira que é impossível ler cinco páginas do livro.
A revolução é bem sucedida? Não sei, nunca consegui chegar no fim desse musical infernal ou desse livro desgraçado.
Hino da revolução: Nenhum. Nós queremos CHAMAR as pessoas pra revolução, não afastá-las. Esse musical é tão insuportável, as músicas são tão chatas que até eu, nascida e criada por ideais revolucionários, duvidei da revolução.
Versos mais revolucionários: sl, "sacre-bleu somos pobres" (isso não é um verso de vdd)
Minhas considerações: Eu sou uma fã de musical mt esquisita, porque eu não gosto do gênero musical MUSICAL. Se vocês perceberem, a maioria dos musicais aqui são na vdd opera rocks ou com ritmos tipo hip hop. De qualquer maneira, esse musical junta muitas das coisas que eu odeio: literatura francesa, dramalhão e eurocentrismo. Não devia nem existir, não merece nem imagem nessa letter, desgraça.
Nota: -50/10
queima quengaral kkkkkk
10.
Rent
A história: Jovens babacas se recusam a pagar o aluguel
A revolução é o tema central? Não. Aliás, qual é o tema central desse musical? Impossível descobrir!!!!
A revolução é bem sucedida? Não, porque pra começo de conversa nem existe uma proposta revolucionária. Mesmo com uma possível faísca de luta, os jovens não chegam aos debates sobre as lutas de classe e, assim, perdem a chance de trazer uma discussão essencial pro grande público. Estadunidenses, vão ler Marx.
Hino da revolução: A real é que só lembro de duas músicas desse musical e ambas são péssimas. Não recomendo
Versos mais revolucionários: Não há.
Minhas considerações:No mundo do teatro musical, reza a lenda que a peça é maravilhosa e o filme é a pior coisa do mundo. O meu lugar de fala é de uma pessoa que só viu o filme, então quem sabe eu mudo minha opinião sobre esse musical. Mas aviso: as chances são pequenas, porque se eu for gastar dinheiro pra ver musical não vai ser com um que abre sugerindo a medirmos a nossa vida por AMOR, ou "cafézinhos" (tradução oficial de Rent pra português, vim a descobrir por causa daquele programa absurdo Cultura, O Musical).
Dito isso, o meu hot take sobre Rent é simples, mas poderoso: Rent parece uma peça que o Dan Humphrey escreveria no final da faculdade. É um musical que pode até parecer interessante e há quem ainda diga profundo e revolucionário, mas a verdade é que é claramente uma visão tosca de um homem cis hétero classe alta mas não 1% (digamos, 2%) que se acha um aliado das minorias e super revolucionário porque está falando de pessoas POBRES e LGBTs* que têm AIDS e são DROGADAS!!!! Mas no fim das contas temos uma peça com uns rock n roll lixo em um tempo histórico em que rock é um gênero hegemônico que assassina a única personagem trans. Ou seja: uma grande bosta. Todos os personagens são mimados e babacas e eu queria bater em todo mundo, menos a Angel tadica. Foi uma experiência horrível ver o filme e ouvir as músicas pra tentar responder as questões acima.
*sejamos honestas, ele nem sabe que existem várias outras letras pra sigla
Nota: 0/10
poetic cinema
9.
High School Musical
A história: Juntados pelo acaso (destino?), pelo amor e pela métrica jock-nerd, um atleta e uma cdf enfrentam os preconceitos de suas classes sócio-culturais para poderem fazer uma audição para a peça da escola
A revolução é o tema central? Surpreendentemente, sim! Todo o ponto do musical é como transformar a mentalidade daquela sociedade (os alunos da escola) para que os alunos possam ter mais de um interesse, como basquete e creme brulée!
A revolução é bem sucedida? Sim, é um filme da Disney afinal de contas. Se a revolução é do lado dos mocinhos, eles vão ser bem sucedidos
Hino da revolução: We’re All in this Together, quando até quem era contra a revolução se descobre a favor dela porque, afinal de contas, estamos todos nessa juntos
Versos mais revolucionários: “To get to the place/ To be all that we can be/ Now's the time/ So we're breaking free” – Breaking Free
Minhas considerações: Eu tinha 12 anos quando HSM foi lançado e eu Vivi esse momento. Foi o primeiro musical que eu fui fã e eu 100% sabia todas as coreografias e tenho orgulho de dizer que sempre interpretei e sempre interpretarei Troy Bolton. Foi o Zac Efron que me fez ver Hairspray e assim entrei real oficial para o mundo dos musicais.
Minhas opiniões sobre HSM mudaram muito ao longo dos anos e eu questionei se esse musical deveria ou não entrar na lista - assim como tantos outros. Foi em uma conversa com a Sofia (oi, amiga) que ela me abriu os olhos para a Verdade: High School Musical é um musical sobre a revolução. Tudo gira em torno da mudança sócio-estrutural daquela sociedade (o colégio) e os personagens principais se colocam constantemente contra o sistemas que estabelece o status quo entre os alunos. Ao contrário de Grease, um musical que não entrou na lista, nossos personagens principais não se dobram ao sistema e mantém suas identidades apesar do preconceito que sofrem. Surpreendendo a muitos, se não todos, percebemos com isso o quanto HSM é mais revolucionário que Grease em seu discurso, mesmo sendo de uma corporação como a Disney.
Nota: 6.5/10
essa cena é meio ruim mas é mt boa né
8.
Across The Universe
A história: Durante os anos 60, jovens nos EUA sofrem e se envolvem com a contracultura
A revolução é o tema central? Mais ou menos??? Não dá pra negar que pelo menos os ideais revolucionários da contracultura estão presentes, mas dizer que esse é o tema centraldo musical me parece um exagero.
A revolução é bem sucedida? Acho que não, né? A guerra do Vietnã continuou, os EUA ainda são capitalistas e imperialistas, continuamos aí com os movimentos sociais, as pessoas ainda não entenderam que vidas negras importam etc.
Hino da revolução: É meio ridículo escolher uma música, porque são todas músicas dos Beatles, mas digamos Give Peace a Chance, que não tá no musical e nem é dos Beatles
Versos mais revolucionários: É igualmente ridículo escolher um verso pelos mesmos motivos, mas digamos "Because the world is round it turns me on", pela piada com os terraplanistas e a galera da mamadeira de piroca (que tempos, amigos, que tempos)
Minhas considerações: Quando eu era adolescente, eu amava muito esse filme. Lembro ainda do prazer estético de ver cenas como a do Strawberry Fields Forever, I Want You e Helter Skelter. Eu voltava pra casa depois de passar horas demais na minha escola abusiva e ficava vendo Across the Universe #impactada e melancólica. Depois que essa fase passou, nunca revi o filme. Eu passei a ter muita preguiça dos Beatles ao longo dos anos apesar de reconhecer tudo de bom que eles fizeram e saber cantar quase todas as músicas. O que descobri é que Beatles - assim como esse musical - me deixa muito melancólica, e eu não gosto de estar melancólica. Eu gosto de estar feliz.
Nota: 7.8/10
arte
7.
Rocky Horror Picture Show
A história: Um casal de recém noivos claramente muito reprimidos sexualmente precisam passar a noite em uma mansão onde moram alienígenas da transexual Transylvania e daí sexo loucuritas e golpes de Estado
A revolução é o tema central? Depende. Se a gente estiver falando sobre revolução sexual, eu diria que sim. Mas não no sentido de uma revolução no sistema político-econômico-social, que é o que estamos usando aqui, é verdade
A revolução é bem sucedida? Sim! Brad e Janet não reprimem mais sua sexualidade, então yay pra revolução sexual. E ainda há o GOLPE DE ESTADO, que não podemos saber se é algo bom ou ruim, porque não sabemos como era o estado político na Transylvania
Hino da revolução: Sweet Transvestite, é claro!!!!
Versos mais revolucionários: "Don't dream it, be it" - Don't Dream It, Be It
Minhas considerações: Assistir Rocky Horror pela primeira vez é aquele impacto estético que vai ficar pra sempre na sua vida. É tipo ver um filme do Almodóvar na fase raiz pela primeira vez sem nunca ter visto nada do Almodóvar. É tudo LINDO e LOUCO e ÓTIMO. Eu nem tenho muitas considerações, o musical fala por si mesmo. Só quero deixar aqui registrado que é um musical que eu amo e fico muito triste de nunca ter ido naquelas exibições que as pessoas interagem com o filme. Inclusive, que tradição maravilhosa essa. Aleluia, jovens
Nota: 8/10
É mt mais difícil do que eu esperava achar um gif do Hair em boa qualidade
6.
Hair
A história: Jovens alternativos nos anos 70 decidem NEGAR A SOCIEDADE!!!!!!!, usar drogas e ter cabelo comprido e despenteado
A revolução é o tema central? Surpreendentemente, não! É estranho porque você pensa em Hair e você pensa WOW REVOLUÇÃO, mas a real é que eles estão muito mais na negação pura da sociedade do que na construção de uma nova sociedade. Faz sentido se você parar pra pensar que é um musical passado durante os anos 70, não 60. Tava todo mundo triste e frustrado mesmo só querendo bater o pé e fazer birra
A revolução é bem sucedida? Não. Aliás, é um final bem deprê, né. Guerra, morte, gente burra etc.
Hino da revolução: Aquarius. Não apenas o hino da revolução no musical, como NA VIDA!!!!!!! Aquarius transcende seu nicho e sua geração e enche o coração de todo mundo levemente dado à contracultura de alegria e esperança
Versos mais revolucionários: "Easy to be hard/ Easy to be cold/ Easy to be proud/ Easy to say no" - Easy to Be Hard, pelo puxão na orelha vindo da luta interseccional
Considerações minhas: A primeira vez que vi esse musical, nos meus belos e ingênuos 13 anos, eu pirei e amei e fiquei É ISTO. Revendo o filme como uma jovem adulta e tendo vivido na pele o que é o famigerado ME (Movimento Estudantil) e o que foram os anos a partir de 2013 no Brasil, eu fiquei com muita raiva de tudo nesse filme (com exceção de Easy To Be Hard, o lindo tapa na cara que o jovem popularmente conhecido como Esquerdomacho precisa) exatamente porque é a negação pela a negação, sem nenhuma proposta de construção de outro sistema ou mesmo só uma linha de pensamento. Foi particularmente legal ter uma conversa com meus pais - ambos jovens durante os 80/90 - sobre o musical, em que eles me lembraram que, nos anos 70, a negação era por si só revolucionária, porque ela vinha de uma resposta dupla ao movimento da esquerda falida dos anos 60 e ao mesmo tempo do mundo capitalista que simplesmente Não Dá, o que me deixou bem mais ok com todo o musical. De qualquer maneira, as músicas são ótimas e esse é o único momento em que aceito atores pelados no palco sem pensar que o teatro precisa acabar
Nota: 8.2/10
meu bb
5.
Hairspray
A história: Uma jovem gorda, feliz e levemente sem noção quer dançar na televisão e deixa muitos racistas gordofóbicos putos. Mas ela tem AMIGOS e um NAMORADO e eles juntos vão mudar os padrões televisivos!
A revolução é o tema central? Sim, todo o ponto do musical é modificar as estruturas sociais de maneira que seja aceito que pessoas fora do padrão tenham um espaço real na televisão de Baltimore
A revolução é bem sucedida? Sim, a televisão de Baltimore se torna oficialmente integrada, a Tracy dança na televisão, a Maybelle vira co-apresentadora do programa mais popular e a pequena Inês se torna a miss Baltimore
Hino da revolução: I Know Where I’ve Been pros momentos de dor da luta, e You Can’t Stop The Beat pros momentos motivacionais
Versos mais revolucionários: "There's a dream in the future/ There's a struggle we have yet to win/ And there's pride in my heart/ 'Cause i know where i'm going/ And i know where i've been” - I Know Where I've Been
Minhas considerações: Hairspray foi o musical que me fez gostar e querer conhecer mais musicais, então ele sempre vai ter um carinho no meu coração. Foi o primeiro musical que vi no teatro e também vamos mandar um beijo especial pro Zac Efron e pra Queen Latifah por terem me chamado pra ver a versão de 2007.
É ÓBVIO que é um musical problemático porque coloca uma branca no centro da luta anti-racista né. Isso não tem nem o que dizer. Ao mesmo tempo, acho HILÁRIO (e por hilário, quero dizer ótimo) quando tá na manifestação anti-racista e a Tracy, branca, chama atenção do policial DANDO UMA CARTAZADA NELE ALSKDJFASDKJF é o tipo de falta de noção que vem com a branquitude (falo isso como branca) e que leva a tanto problema, como por exemplo VIOLÊNCIA POLICIAL, como acontece no musical. E eu genuinamente gosto que tem isso na história, mesmo que só de passagem e sem um momento de parar e pensar nos atos.
Mas acho que o principal, o que me faz ficar ok com absolutamente todo o ridículo e todo o problemático problemático é que esse é um musical simplesmente FELIZ. Impossível terminar de assistir e não estar BEM (e possivelmente cantando e dançando)
Nota: 8.5/10
#enemies to lovers
4.
Wicked
A história: Uma fada reconta sua história de amor com uma bruxa revolucionária anti-racista que desafia o governo de seu país tendo que esconder que ela é uma infiltrada do sistema e está do lado da revolução
A revolução é o tema central? É discutível se a revolução é o tema central, mas ela é definitivamente essencial tanto para a personagem principal quanto para o desenvolvimento do roteiro
A revolução é bem sucedida? Não. A Elphaba consegue libertar os seres mágicos e vencer a luta contra o Mágico, mas ela ainda é vista como uma vilã pelo povo de Oz e precisa ser "assassinada". E por mais que ela sobreviva e termine tendo uma vida heteronormativa com o "amor" dela, o que seria considerado um final feliz no musical, não existe direito uma mudança sistêmica econômica-social-cultural que faça com que consideramos a revolução bem sucedida
Hino da revolução: Defying Gravity, também conhecido como o hino absolute nightmare
Versos mais revolucionários: "Unlimited/ Together, we're unlimited" - Defying Gravity
Minhas considerações: Sempre tive muita preguiça de Wicked porque se tem um musical que odeio profundamente é O Mágico de Oz, então achava que a fic da bruxa não tinha como ser boa. LEDO ENGANO, MINHAS CARAS. Acabei vendo o musical no aniversário de uma amiga minha em SP e foi maravilhoso demais mddc me ganhou em tudo. TUDO!!!! O ship lebisko, a fic de Hogwarts, A ELPHABA MEU BB CONFUSO E REVOLUCIONÁRIO QUE NUNCA ERROU!!!!!!!!!!!! Personagens confusos e revolucionários que representam minorias CONTEM COMIGO PRA TUDO.
Não bastando, tem umas músicas que pegam muito de jeito. Por exemplo, não vou dizer aqui quantas vezes chorei ouvindo Defying Gravity e o motivo é porque simplesmente perdi a conta. Outra que me pega muito é a abertura, No One Mourns The Wicked, porque como uma pessoa que se identifica profundamente como wicked (absolute nightmares, não tem jeito) sempre dói um bocadinho quando a Glinda canta que a vida dos wickeds é sozinha e os wicked morrem sós. Mesmo quando isso se comprova factualmente errado no musical. Ainda existe esse sentimento esquisito que "when you're wicked, you're left on your own". Ao mesmo tempo eu vou sempre amar essa coisa de wicked serem aqueles que se opõem a governos opressores, porque sou filha da contracultura SIM. Além do mais, quem tá cantando é a Indina Menzel, né bbs. Não tem jeito. Essa mulher te faz Sentir até quando você odeia profundamente a personagem dela (estamos olhando pra você, Rent).
Dito isso, um absurdo elas não serem abertamente lésbicas
Nota: 8.8/10
Imagens reais da Juia, eu e Jumed (em ordem) animadas
com a revolução
3.
Hamilton
A história: Alexander Hamilton é um imigrante mt loko que quer FAZER A REVOLUÇÃO!!!!! e também PROVAR QUE ELE É MUITO MAIS DO QUE OS ESTEREÓTIPOS PRECONCEITUOSOS QUE PENSAM DELE!!!!!! Ele se junta com uma turminha da pesada, dispara canhões nos ingleses, flerta com MUITAS PESSOAS e é caga horrores (metaforicamente. Não há menções a cocô no musical)
A revolução é o tema central? Sim. A história é sobre um revolucionário cuja prioridade é fazer a revolução e, depois que ela ocorre, sua prioridade é manter os ideais revolucionários ao mesmo tempo em que busca o país se reerguer depois da guerra e poder prosseguir de maneira segura durante a história. Todo o resto é floreio pra quem gosta de romance (eu)
A revolução é bem sucedida? Sim! Nós temos os Estados Unidos até hoje, afinal de contas
Hino da revolução: Hamilton é TÃO revolucionário que não tem um, mas DOIS grandes hinos da revolução: My Shot, que é sobre WOW COMO SOU INTELIGENTE VOU MUDAR O MUNDO VOCÊ VAI VER OLHA COMO MEUS AMIGOS SÃO VIRADOS NO JIRAYAH A GENTE VAI ATEAR FOGO NOS GRINGOS SIM. E The Schuyler Sisters, que é sobre WOW OLHA SÓ REVOLUÇÃO IDEIAS PESSOAS MT LOKAS DANDO UNS BERRO FEMINISMO TAMBÉM POIS SOMOS ÓTIMOS PRA ESTUDOS PÓS-COLONIAIS
Versos mais revolucionários: Tem muitos versos que acho que atendem muito bem. O que mais tem nesse musical é gente brindando à revolução. Até no casamento, eles brindam à revolução!! Mas talvez o mais apropriado seja o simples "The world turned upside down", em Yorktown (The World Turned Upside Down), confirmando que o musical é de fato sobre REVOLUÇÃO e não uma simples revolta, porque os sistemas sócio-econômicos mudam junto com a cultura etc. e tal.
Considerações minhas: Eu amei Hamilton do momento que escutei pela primeira vez. Tem tudo que eu gosto em um musical: ritmo que não é de musical (risos), revolução, gente loka e lixo, um amor impossível e ships esdrúxulos. Acontece que eu demorei mil anos pra ouvir PORQUE A PREMISSA NÃO ME CONVENCIA DE JEITO NENHUM!!!!!! Eu entendo e acho super importante a mudança de perspectiva do primeiro secretário do Tesouro dos EUA ser visto como um imigrante não-branco, mas no fim das contas é um musical que diz OLHA ESSE BRANCO COLONIZADOR CAPITALISTA ELE É BEM TOP e isso nunca desceu bem. Meu anti-imperialismo sempre tocava um sininho de MERMÃO NÃO, o que dificultou muito conseguir lidar com a premissa do musical e ir além.
DITO ISSO, a partir do ponto que eu consegui lidar com essa bizarrice porque estadunidense é bizarro etc. e tal, eu amei muito o musical e acho que tem umas sabedorias excelentes. Não apenas o "não traia sua esposa e conte pra ela através do jornal", mas tudo sobre NÃO TER CONTROLE!!!!!!! DE NADA!!!!!!!!!!! VOCÊ NÃO TEM CONTROLE DE QUEM VIVE, MORRE OU CONTA SUA HISTÓRIA!!!! E também a parte que eles estão na guerra e é assim:
- Stay alive 'till this horror show is past/ We're gonna fly a lot of flags half-mast
- Raise a glass!
Porque é o máximo de "é, a gente fala bem da revolução e brinda a ela, mas a real é que revolução é GUERRA!!! E MORTE!!!!! E TRAUMAS!!!!!", o que é um soco que a gente tem que levar mesmo
Nota: 9.5/10
todo amor ao MEU filho de deus
2.
Jesus Christ Superstar
A história: Jesus Cristo, um jovem pobre de 33 anos, está ganhando cada vez mais importância política em sua comunidade e o governo ditatorial não vê isso com bons olhos. Enquanto isso, Jesus e seu melhor amigo, Judas, começam a ter divergências quanto às estratégias para promover seus ideais revolucionários
A revolução é o tema central? Não, mas ela está no coração do musical. Explico: todo o ponto de JCS é provar que Jesus foi o primeiro superstar na Terra e, pra isso, nós acompanhamos os últimos dias de vida de Jesus, podendo ver as tensões que vêm com o movimento revolucionário de Cristo cada vez maiores e mais latentes até que todos perdem o controle e acontece a bagunça que acontece. Assim, o tema central do musical é, na verdade, a humanidade. Mas para tratar dela, o que vemos é um movimento revolucionário que está saindo de controle
A revolução é bem sucedida? Não e sim e não de novo. Não porque Jesus morre e é assim que termina o filme né. Daí sim porque a gente sabe que a morte de Jesus foi o que culminou no movimento e o espalhou ao redor do mundo. Mas daí não de novo porque os ideais revolucionários foram descaracterizados, manipulados, corrompidos pelo que hoje é a Igreja
Hino da revolução:Não há. Esse é um musical sobre as tensões da revolução, não sobre as alegrias desta, mas vou recomendar Heaven On Their Minds por ser revolucionária ao se pensar a Igreja que temos hoje em dia
Versos mais revolucionários: Não tem um verso único e puro que seria revolucionário, mas sim versos em suas relações com o contexto em que são ditos. Judas abrir o musical dizendo "If you strip away/ the myth from the man/ You will see where we all soon we'll be" ou questionar quem foi Jesus e por que raios ele é tão importante assim em Superstar é revolucionário por exigir uma perspectiva humana de alguém que é considerado filho de Deus. Jesus não reagir à violência que lhe é causada pode também ser vista como revolucionária por sua postura fundamentalmente não-violenta, assim como é revolucionário ele negar se dizer filho de Deus e responder às autoridades o tempo todo dizendo apenas "You say that I am", ou ainda ele responder ao Simon depois deste ter cantado que JC vai ter todo poder e a glória que ele quiser que ninguém entende o que poder e glória é kkkkkk amo
Minhas considerações: Admito que tinha minhas dúvidas quanto a esse musical quando meu pai me pôs pra ver nos meus idos 13 anos. Educada e me considerando ateia, eu não me interessava por nenhuma história bíblica, principalmente a de Jesus Cristo, por ter uma visão ligada às Igrejas católicas e evangélicas, que são bem problemáticas. No entanto, logo na primeira música fui totalmente convencida de tudo no musical (tanto que foi o meu musical preferido e assim continua, mas agora dividindo o pódio com Hamilton).
Quando mais nova, eu me identificava profundamente com Judas ao questionar as escolhas de Jesus e apontar os problemas da condução dele de deixar ser endeusado e fazer com que sua imagem fosse maior do que suas ideias. Ao longo do tempo, no entanto, comecei a gostar cada vez mais de Jesus. Hoje em dia, acho HILÁRIO o quanto ele fica irritado por tudo e explode a qualquer segundo, ao mesmo tempo que entendo de onde vem isso - da pressão impensável de ser o líder de um movimento revolucionário gigantesco (que está dando errado). Depois de ter vivido o feminismo com mais afinco, as greves na faculdade e, bom, todo o desastre político de 2016 a diante, eu sinto e entendo e me identifico demais quando JC canta "First I was inspired/ Now I'm sad and tired/ After all I tried for three years/ Seems like thirty, seems like ninety". Também passei a ver a sabedoria de Jesus, principalmente com "To conquer death you only have to die", que é uma porrada LINDA e eu AMO.
Eu posso passar uma vida falando desse musical. Os hippies, a representatividade, o ship Judas/ Jesus (é INJUSTO colocarem Judas pra cantar o REPRISE DA MÚSICA ROMÂNTICA da Maria Madalena pra Jesus), tudo. Eu escrevi um trabalho de 14 páginas pra uma matéria da graduação sobre ele e tirei 10. Por favor, falem mais desse musical comigo
Nota: 9.8/10
dsclp aí mas imagem de teatro infantil é sempre uó
1.
Os Saltimbancos
A história: Quatro animais se revoltam contra o sistema de exploração humano separadamente, se encontram no meio da estrada e decidem tomar a pousada em que seus opressores estavam e fazer uma ocupação comunista alternativa
A revolução é o tema central? Sim. Todo o ponto do musical é SE VOLTAR CONTRA O SISTEMA!!!!!!
A revolução é bem sucedida? Sim, duas vezes! Os saltimbancos não apenas tomam a pousada do barão e colocam seus opressores pra correr como não contam vitória antes da hora e se preparam para uma segunda batalha, que é o que vence os humanos de vez
Hino da revolução: Todos Juntos, apesar de que todas as músicas são extremamente engajadas e revolucionárias
Versos mais revolucionários: “Todos juntos somos fortes, não há nada a temer” – Todos Juntos
Minhas considerações: Esse musical é literalmente comunismo para crianças e é PERFEITO!!!!!!!! Escola Sem Partido quem? Tudo no mundo tem ideologia e eu quero minhas crianças educadas com ideologia comunista SIM. Inclusive, sou a prova viva de que funciona, porque fui uma criança que viu e escutou muito Saltimbancos quando era pequena e, olha só, tô ótima. Inteligente, bonita, cheirosa, de esquerda, niilista, escrevendo sobre musicais, indo pra rua contra o governo e ainda por cima nem uso drogas. Sucesso puro, recomendo.
Não bastando, as letras são PERFEITAS. T O D A S. E eu posso dizer isso com toda a certeza do mundo não apenas porque tenho essa autoconfiança e presunção, mas também porque o próprio senhor doutor Luiz Tatit (ele é importante no mundo da Letras e da Música, ok?) disse. No meu livro de introdução à linguística tem uma análise dos Saltimbancos mostrando como cada animal representa uma classe essencial pra revolução: o jumento é o operário, o cachorro é o exército, a galinha é a classe média trabalhadora, e a gata é a burguesia artística. E daí cê vai escutar direito e é só mddc sabe. Além disso, todos os quatro carregam consigo sabedorias incríveis. Digo, o que é a galinha classe média cantando "pois um bico a mais/ só faz mais feliz/ a grande gaiola/ do meu país"?!?!?!?! Ou a crítica do cachorro quanto à forma que os soldados são tratados no exército?!?!?!?! E olha que eu venho de família que lutou na guerrilha da ditadura!!! Não vemos milico com bons olhos nunca!!! E a gata sendo EXPULSA DE CASA!!!! OU O JUMENTO SENDO O NARRADOR DESSA HISTÓRIA TODA AAAA
Eu adoraria dissertar sobre todas as músicas. Todas as ironias e todas as porradas sutis, mas esse não é o lugar (mas vocês podem e devem me perguntar sobre o assunto em contextos propícios). Mas gostaria de ressaltar aqui a sabedoria que são as três lições do dia:
O melhor amigo do bicho é o bicho (ou seja: o melhor amigo do oprimido é o outro oprimido)
Um bicho só é só um bicho, agora todos juntos somos fortes (essa não precisa de mais nada né)
Os homens, eles voltam sempre (ou seja: os opressores sempre tentaram voltar para o poder)
SABEDORIA!!!!!!!! ARTE!!!!!!!!!!!!!! REVOLUÇÃO!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Mas o mais importante mesmo é a capacidade do Chico Buarque ter conseguido fazer uma música inteira cheia de trocadilhos com OVO e GALINHA sem se repetir. Eu, como uma pessoa chamada Clara, só tenho a agradecer
Nota: 10/10
***
É isso por hoje. Espero que tenham gostado e se divertido. Volto em algum momento na caixa de entrada de vocês com algo mais reflexivo e proto-filosófico. Até então, ✨ let the sun shine in ✨
Beijoks,
Clara